terça-feira, março 30, 2004

Não vou continuar com cara de paisagem para a história. Serei eu desatando os laços que amarram a cena, para que os atores se esborrachem no chão.

sábado, março 27, 2004

Disseram-me que não há recordações do tempo em que as ruas evitavam ser filmadas, hoje se conhece o mais abjeto ser no Congresso Nacional, e pelos bondes as câmeras exigem que tu sorrias, focalizam os assaltos e as pessoas cagando de medo das balas e dos socos e dos cães de briga, mas és obrigado então a observar, telespectador do tédio, senão tu pagas prenda, é a mais pura verdade, não tente iludir-se. Não prefira escolta, nada resolve. Não há luz, nem formas deslumbrantes, nem malabarismos outros para tranformar o ser, mas a exigência é sorriso e a civilidade, senão tu pagas prenda definitivamente. E não invadem a contingência real para se descobrir se pisam em teu pé, nem nada. Aponta-se, sentencia-se e pronto. Não se admite recurso. Do nada, bocas nada atraentes te humilham, te desejam dores e decaptações constantes. Para onde foi sua candura indecente? Se bem que indecência é falaz, mas pelo menos onde andará a ingenuidade? A experiência é rígida, ou tu apenas te exibes?
Subversividade? Anomia? Transgressão? Mas eu quero é passar a vida acordando com o barulho do trem. Me deixa?

Pensas que terás medalhas, honrarias, insígnias múltiplas? Engana-te. És apenas mais um a padecer o desdém dos altivos, se não obtiveres, em tempo, alforria da lucidez devastadora. Aprendi com meus pares, não obscureço estas calamidades transfiguradas como fatos corriqueiros. Dou logo a real, para dizer franca e claramente.

sexta-feira, março 26, 2004

Minhas pernas tremem, tremem, grito e choro, vontade de ir ao banheiro, só que não dão importância.


Me vejo isolado pelos cantos deste mausoléu. Como todo o sempre.

quinta-feira, março 25, 2004

Acho que nunca pretendi mesmo ir a lugar algum. Não adianta dizer que eu sou inoperante, com sua galhardia e sinceridade orgulhosas. Foda-se em sua cloca, sweet, cloaca, e vê se me deixa aqui de bode, que é só o que pedi ao incognoscível. E mesmo assim, sem muita confiança de que o pedido fosse acatado.

Se conselho fosse bom, as gentes arrendariam e o gentio vangloriar-se-ia.

terça-feira, março 23, 2004

Desespera esta ânsia assim infatigável de sair ali naquele elevador quebrado e jogar o primeiro transeunte no poço e depois me lascar escada abaixo só para sentir as costelas quebrando e esquecendo que algum dia houve sangue nestas ínfimas veias.

- Se começar a tocar La Lupe ao fundo, não reclame.

domingo, março 21, 2004

Então deixa eu manifestar minha insatisfação com um dente que empacou, não me permite pronunciar palavras completas, mesmo que minha dicção nunca tenha sido muito significante para a compreensão do meu pensamento. É verdade raramente me faço entender, mas não preciso deste monte de esmalte sei lá que espécie de mármore na boca. Ah, eu salivo muito, principalmente quando sou obrigado a comer bolos de mandioca, quando não gosto, mas é que a fome bate às 03h e eu sou um escravo resignado que não me permito uma saída do emprego, prefiro comprar os tais bolos de mandioca, ai, eles fazem a gente mastigar, é verdade, mas não sei, parece que falta alguma coisa: o gosto propriamente. Acabei de me lembrar que não é mandioca, é tapioca. Eu confundo essas comidas de índio. O nome mais estranho é inhame, mamãe sempre me oferece nas manhãs em que eu pareço em casa, mas eu temo este nome, temo que me cause pesadelos que me inflija um calor aborígene a manhã inteira e que me faça engordar como um porco do mato. Eu agradeço, mamãe, mas eu prefiro sucrilhos, parece isopor, mas é um pouco mais civilizado porque se acha no supermercado da esquina, nem precisa levar sacola para trazê-lo e, é bom que se frise, não é necessário retirar fiapos antes de ingeri-lo, basta misturar leite, ora bolas, mas que não seja o leite aguado integral, porque me lembra a merenda oferecida pelo MEC nas escolas públicas por que passei, com suas merendeiras leoas cantando nas cozinhas-forno. Aqueles prédios rústicos não precisam se alojar na minha memória e leite em grãos é sempre uma referência. Toca o sino, tia, quero ir embora.

Por que nasci tão inapto para a vida?

sábado, março 20, 2004

Sei que nunca recebi benesses do destino. Ao contrário, este tirano, vem me infligindo sagazes golpes, profundas traições, daquelas que nem mesmo o mais abjeto seria desprevenido. Tenho para mim que o meu tempo de tolerância se esgotou. Abandono-o em seus trajes hipócritas e insolentes e me inebrio com outros ares, de senhoria, riqueza, nobreza e reverência. Sim, esta esfera é extremamente perversa. Mas não insistentemente irritante. Mas não abominavelmente impetuosa. Muito diferente daquilo que, desde pequeno, aprendi a acreditar. Mais uma vez me retiro. Mais uma vez peço arrego. Peço licença para nunca mais encarar teu rosto imundo.

||"now I know how Joan of Arc felt"||

sábado, março 13, 2004

Insanas afinidades com a noite me despertavam às duas da manhã para amenizar umas feridas pudendas que despontavam na alma. A madrugada era um colete salva-vidas que me socorria do sufoco, daquela mixórdia clara de dejetos e insuficiências, daquelas mediocridades flutuantes, mas era então que eu tinha alguma esperança de pegar o trem para algo melhor, refúgio de mim mesmo esclarecedor, diáfano oásis perpétuo no meu quarto, este estabelecido na miragem. Eu, navegador de portos não encontrados, me perguntava para onde mirar, onde refugiar o estado de ânimo, desejo incontrolável de segregação e ao mesmo tempo reencontro. Porque, no fundo, deseja-se incansavelmente a partilha, pelo menos neste estágio de parca existência. Desejaria que a sensação de observar os estúpidos de camarote perdurasse consideravelmente.

quarta-feira, março 10, 2004

Por que esta porra não mostra as letras postadas como deveria devidamente nos seus lugarezinhos, certinhas lá, as mesmas sentadas, em pé, ou realizando qualquer coisa que seja?
Não tomo coca-cola nem a força, prefiro tubaína. Manda a tonha ir lá na feira compra tuba-tuba-tubaína.

terça-feira, março 09, 2004


Era de pensar nos carros, nas travessias desta vida, seus contornos, formas, as vias por onde andava, quase nem percebia quando um cruzamento lhe retornava ao inicio de tudo, as lembranças em ciclos. Eram instantes de silêncio e apego a algum reflexo, um foco e, ato contínuo, surgia um motivo aparentemente banal para o isolamento. Agora é a saudade nas suas temerárias e abruptas maneiras de expressão, enquanto me vejo absurdamente perdido naquelas ruas desertas, plena madrugada, ou sozinho as 02 a. m. com um caderno no colo empapuçado de lagrimas, tão distantes, mas as mesmas reminiscências de sempre, os lugares, transeuntes calados ignorando o desespero explodindo no banco ao lado e suas promessas, onde estavam as próprias promessas, ali mesmo esquecidas naquele banco de uma praça, dia chuvoso de março, era tarde e nunca houve esperança, muito embora demonstrasse um certo engrandecimento de si, era simplesmente a insistente duvida de sua fraqueza que, aos poucos, foi-se dissipando, acumulando crostas de rancor e insípido desdém pela própria história, aquela impossibilidade de juntar-se e apanhar o caldo da existência plena, se e que verdadeiramente ocorre algo do tipo para qualquer um ou se apenas vê-se um engano generalizado. Mas o que ocorria era seu coração palpitar em plena madrugada verde-musgo arrancando-lhe as têmporas, o deserto urbano afligindo-lhe lágrimas de abandono, que ele engolia a seco. Foram estacionamentos, centros comerciais, cinemas baratos, pubs secundários, escolas fechadas, escadas nos terminais, a linha das 23h, supermercados vazios, postos de gasolina semi-desativados, rotas esquecidas, parques de diversões em dias úteis, apreensiva vontade de esvaecer nos movimentos eletrônicos dos sinais, era isso tudo que compartilhava da sua solidão.

segunda-feira, março 08, 2004

E doíam meus ombros, meu peito, meu incandescente espectro, naquela dor híbrida, quase rubra, plácida, enervada, era o princípio do meu desespero único, era a minha saudade e a minha comoção de pré-adolescente erigindo e me asfixiando e todo o meu corpo reclamava, e grunhia, porque os corpos temem sim, não tenha dúvida. Foi assim que acordei, vi que era apenas uma exarcerbação ordinária do que os sonhos fazem com as nossas mais comezinhas sensações. Era apenas sonho+indigestão.

sexta-feira, março 05, 2004

Voyeurism
Ela passou em segundo lugar, mas de qualquer maneira entrou. Ela e aqueles olhos que escondem sabe-lá-que-prazeres, olhos fenícios, isso sim, ela é até tranqüila e chega cedo. Tem um certo nervosismo lapidado, eu sei. Coitadinha, agora ganha um salário e meio pra penar dez horas. Dizem que a moça até já foi "modela". Se bem que aquela cara de junkie dela não engana. Mas até o fim de seus dias, ela nunca passará desapercebida. Dou fé, à tardinha, enquanto ela deve estar dando de comer aos grilos.

quinta-feira, março 04, 2004

Esta é a pura verdade, quem nasce injuriado, deve morrer injuriado, infeliz, desumanizado para sempre e cru, extremamente cru, e desanuviado das intensidades da vida, porque, neste diapasão, só se for a intensidade do desprezo isolado em um mar aberto de escuridão, temor e sombras, sem querer ser, mas sendo praticamente piegas, como eu tenho vontade de estourar sua cara com bombas, senhora Humanidade, personificada naquela desgraçada que atende o balcão das horas, nos despachantes, delegados, professores e demais autoridades, como eu queria mandá-los todos para a extremidade das secreções. Essas caras mal nascidas, eu as odeio infinitamente. E se você me pede uma carona, baby, eu digo FUCK YOU!

terça-feira, março 02, 2004

Hoje me peguei com a indagação de que se, em verdade, eu não seria uma cilada para minha pessoa mesma.

É bem possível, bem.