domingo, junho 27, 2004

Bem, se fosse eu advertido que tudo é assim, esse eterno patinar sobre desintegrações, desafios, tristezas incontidas, palavras cortantes, introspecções, desafetos, se me dissessem que tudo não passaria de repulsivas contrações, desejos de vingança, ofensivas multilaterais, impetuosos gestos injuriosos, desclassificações, aflições, temeridades, se me dissessem, ainda que com onomatopéias, que restaria consternação, somente consternação, não teria cravado os dentes no tempo, nas pessoas, tampouco nas histórias.

sexta-feira, junho 25, 2004

É ali, naquele canto, algo ali me enerva, instaura no meu peito a desilusão, a amargura plena, o desagrado, o desrespeito, a retomada de misérias pequenas de cada pedaço inflando, queimando, mostrando décadas de sina estúpida e extremamente penosa. Mas sim, é também este canto que alerta ser a resignação a única via possível nestes desencantos diários.

sábado, junho 19, 2004

Arranco os estilhaços, suturo as feridas, os pontos ainda não se fecharam. Assim, vai permanecendo a clausura, a doce e leve, irônico perdimento de meus traços, passos fixos, lentidões, cansaço, o mesmo rigor, a mesma disciplina, a quase desistência. A falta de manejo com o hábito e as divagações de pueril existência. Falta de controle de si e indiferença própria dos renegados. Ofereço as vestes, o ímpeto, a candura. Ofereço os sonhos, as taças e os restos da fruição, daquelas noites de esperança, que ali restaram intactas, muitas vezes perplexas com a inaptidão. Faltavam-me certamente gestos atávicos, a semelhança, a semelhança, de que ainda percebo a perfeição e grandeza nestas horas de remendos, lamúrias e descontentamento.

sábado, junho 12, 2004

Que visgo é este que aplaca um nojo amargo na garganta?
Que visgo é este que atravessa a parede do meu tédio para espantar meus planos?

Qual a sinopse da tênue liberdade noturna neste sábado fosforescente?

São perguntas indóceis, fáceis de distinguir, mas que impossibitam acesso claro a qualquer dedução.


Não queres se abrir? Abrir como uma lata de cerveja? Saca uma lanterna do teu bolso e invade o caminho de pedras.

segunda-feira, junho 07, 2004

Era o que eu pensava ser o outro lado do espelho,
de onde vem a aurora, o retrato da onipresença por detrás dos anos.
Era o que eu pensava ser minha face deformada pelos gestos alheios.
Mas não era outra coisa, senão a minha própria imperfeição,
aquela que eu sempre reneguei, por mais encravada na minha história, por mais saliente que minhas pusilânimes veias,mais abjeta que certos corpos em estúpidas manhãs. Aquela que poderia me revigorar e me inserir definitivamente no mundo das estranhezas - pois não se esmere em descobrir um mundo alijado de absurdidades - mas que eu insistia em crer-me inatingível face os seus reflexos. Agora, afinal, vejo o quanto aquela cegueira inundava e entorpecia. Não sei até que ponto me fiz simulacro de idéias, me fiz ágil ou muitas vezes eficiente.
Talvez assim permaneça. Talvez reconheça incapacidades ou retorne simplesmente à mesma curvatura cíclica da incerteza. Agora, ao menos, eu posso aguardar a dentada da consciência nesta trajetória assimétrica.

sábado, junho 05, 2004

Em noites assim tão entendiantes, espero incólume o açoite espontâneo de mim mesmo.

"Tateio. E a um só tempo vivo
E vou morrendo. Entre terra e água
Meu existir anfíbio. Passeia
Sobre mim, amor, e colhe o que me resta:
Noturno girassol. Rama secreta. " Hilda Hilst



.. tomei vacina contra más influenzas ontem, de graça até injeção, no meu braço colesteróide. até agora espero os efeitos colaterais? cadê? cadê? tem de côco?

sexta-feira, junho 04, 2004

Façamos, então, a lição.
Primeiro puxa o gatilho, amolece os dedos, crava os dentes no peito, amarra os sonhos e atira no tédio.
Morde os tentáculos dos dias, antes que a cavalgada te atropele.
E, então, estaremos prontos para comprar pastel na feira do dia. Pastel de vento lisérgico e fosforescente, como os artefatos chineses contrabandeados.

a ouvir John Frusciante

quarta-feira, junho 02, 2004

Contra os efeitos das amenidades cotidianas, cha de beterraba terçã, com doses insuspeitas de perversão e desuso. Sejamos perfeitos detratores, então. Hoje é quarta-feira e quem não deseja quebrar o lastro de vidro que envolve a semana que provoque o primeiro estilhaço, baby.

Oh, modorra das manhãs de quarta-feira, não diz esta perseguição dura a vida inteira. Assim, te ofereço torradas.